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    Segunda, 09 Abril 2018 19:40

    Vai um quibe aí, mano?

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    Vai um quibe aí, mano? Fotos: Délcio Magalhães

    Délcio Magalhães e quibe de arroz – quitute original da culinária roraimense

    De segunda a sexta, a partir das seis horas da manhã, em sub-esquina das ruas Coronel Mota com General Penha Brasil, lado oposto do IBR (Instituto Batista de Roraima), as portas amarelas do modesto comércio são abertas. Mesas e cadeiras são postas sob um toldo e redomas de vidro contendo esfirras, pastéis, pães de queijo e croquetes são montadas. Por ali, dentro de seus veículos, alguns fregueses já estão esperando os quibes de arroz, quentinhos, piece de resistence da casa. Montados pelo dono da lanchonete, Délcio Magalhães, o delicioso quitute roraimense começa a ser consumido.  Saem aos montes.

    Comerciários, secretárias e servidores públicos de repartições, lojas e escritórios da vizinhança ocupam seus lugares para o segura-peiito. Café com leite, sucos naturais, tapiocas, ovos fritos e cuscuz são servidos com ajuda dos filhos - Klark, 23, e Daniel e Davi, gêmeos de 18 anos.

    Entre um e outro atendimentos, Délcio comenta os últimos fatos trazidos pela televisão. Fala mal de políticos e da política, condena criminosos à morte, dá surras em cabras safados, faz piadas com as operações da Polícia Federal e com “os magotes de bandidos que são presos com milhões de dólares, enquanto Educação, Segurança e Saúde do Brasil estão na UTI”.

    Inteligente, conversador, com boas noções de cidadania, o microempresário critica motoristas que vêm deixar seus filhos na escola ali em frente e criam filas duplas ou estacionam em locais proibidos. “Aquela ali pensa que é dona da cidade: para no meio da rua e atrapalha todo o tráfego, enquanto o catarrento dela desce do carrão. Noutro dia, quase que essa loira recebe umas porradas de uma mulher mais abusada do que ela”; “O outro ali, oficial da Polícia Militar, devia dar bom exemplo, mas se acha a autoridade das autoridades; as leis de Trânsito só valem para os outros. Olha onde e como ele estacionou o carro. Que exemplo esse povo dá para os filhos?”

     

    Com a mão na massa

    Vendendo quibes e outros salgados, Délcio adquiriu casa própria e educa os filhos. Os três rapazes cursam Educação Física em faculdade particular.

    Antes, Magalhães sobrevivia de reformas e pequenos serviços em imóveis. Diz que o sangue falou mais alto: “Minha avó era quituteira de mão cheia; meu pai [Délio] teve uma das melhores peixadas de Roraima nos anos 1960, 1970 e 1980; e eu tenho prazer quando estou na cozinha”, explica.

    “Em 1985, fui ao primeiro Rock in Rio. Na volta, hospedei-me numa pousada em Ouro Preto [MG] e, nela, comi a melhor esfirra de minha vida. Pedi pro turco me passar a receita, mas ele negou. Uma tarde, fiquei brechando a cozinha dele e peguei a manha. Quando retornei para Boa Vista, comecei a fabricar e vender esse quitute sírio  onde hoje é o Complexo Poliesportivo Ayrton Senna. Vendo o valor que nossos conterrâneos dão ao quibe de arroz, desenvolvi minha própria receita e passei a vendê-los também. Hoje, o carro-chefe de minha lanchonete é o quibe de arroz”, comenta.

     Clientes cativos, os estudantes Beatriz Rocha Pinheiro e Nilton Souza batem ponto de segunda a sexta na quiberia de Délcio Magalhães

    Boca a boca

    Atualmente, ao lado de outros quitutes, Délcio vende cerca de 220 quibes por dia. “A procura vem aumentando. Com a propaganda boca-a-boca, vem gente de bairros distantes pra merendar em minha lanchonete. Muita gente leva de 10, 15, pra comer em casa ou no trabalho”, festeja.

    Magalhães afirma ter clientes que levam dezenas de quibes ainda crus para serem fritos em Manaus e Brasília.

     

    Marketing

    Enquanto o preço do quibe de arroz vendido em outras bancas varia entre R$ 2 e R$ 3, Délcio vende a unidade por R$ 1. “Não sei se esse pessoal ganha muito, sei que compro meus ingredientes na fonte e dá pra eu ganhar o meu trocado vendendo a esse preço”, justifica.

    Placa amarela anunciando o produto e seu valor atrai novos clientes. “Tem um pessoal da Prefeitura que descobriu minha lanchonete; hoje, eu vendi 70 quibes pra lá. Quem também está se chegando são os servidores do Tribunal de Justiça”, comemora.

    Planejador cauteloso, o microempresário sonha em dar passos maiores. “Não sei quando, mas ainda vou montar estrutura para vender pratos feitos e comida a quilo. Meu irmão, se você provar a rabada que eu faço, você nunca mais vai se esquecer dela”, autoelogia-se.

     

    Fiado? Nunca

    Radical, Magalhães não vende fiado. “Eu compro tudo à vista, por que que neguinho vem querer fiar um lanchezinho de três, quatro reais? Noutro tempo, tinha um pessoal que merendava aqui e pagava no fim do mês. Tive muitos aborrecimentos: algumas pessoas sumiram, outros questionavam o valor da conta. ´Foi quando decidi que só venderia à vista”, diz taxativo.

    Délcio Magalhães recebeu a reportagem do Roraima Agora às 17h de uma quarta-feira. Às 18h, depois que tocou o sinal de fim de aula do IBR, o pequeno espaço da lanchonete foi invadido por adultos e crianças querendo lanchar.

     

     

     

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    Aroldo Pinheiro

    Aroldo Pinheiro,  roraimense, comerciante, jornalista formado pela Universidade Federal de Roraima. Três livros publicados: "30 CONTOS DIVERSOS - Causos de nossa gente" (2003), "A MOSCA - Romance de vida e de morte" (2004) e "20 CONTOS INVERSOS E DOIS DEDOS DE PROSA - Causos de nossa gente".

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