Sábado, 15 Abril 2017 19:50

    Hipocondria Destaque

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    - Bom dia, dona Rosa, tudo bem?

    - Que nada meu filho, a coluna hoje tá incomodando tanto que dá vontade de morrer...

    - Oi, dona Rosa, há quanto tempo; alguma novidade?

    - Essa enxaqueca me incomoda demais. Já tomei três Cibalenas e a dor de cabeça não passa...

    - Ei, dona Rosa, a senhora por aqui? O que houve?

    - Vim trazer a mamãe pra fazer a hemodiálise. Enquanto ela está na máquina, aproveitei para bater uma chapa, pois ando sentindo umas dores muito esquisitas na parte superior do
    pulmão esquerdo. Acho que tenho algum problema na pleura.

    Cefaléia, otite, sinusite, gengivite, afta, bócio, bursite, artrite, hérnia de disco, bico de papagaio, prisão de ventre alternada com diarréias, corrimento, joanete, unha encravada, ela reclamava de tudo. Doença era com ela. Dona Rosa reclamava até de peido engatado. 

    Quando dona Rosa não tinha nenhum sintoma anormal, transferia para os parentes. Suas conversas eram sempre recheadas com doenças e tratamentos. Além da hipocondria, ela era
    de um pessimismo ímpar. Acho que, quando criança, assistiu muito aos desenhos de Hardy Har-har - aquela hiena que passava o tempo todo resmungando “Oh, dia..., oh, azar... Eu acho que não vai dar certo”.

    No dia seguinte ao seu quinquagésimo aniversário, dona Rosa decidiu fazer um check-up. O médico, ao estudar o calhamaço de exames, auscultar, e medir pressão, deu-lhe a inesperada e triste notícia:

    - Dona Rosa, a senhora tem saúde de ferro; nesse embalo a senhora chega fácil, fácil nos cem anos.

    A paciente caiu em desespero:

    - Esse doutorzinho é um incompetente. Já pensou: vem dizer que eu, logo euzinha, não tenho nada? Vou procurar outro médico, pois tenho certeza que minha saúde não anda nada
    boa... Pra cima de moá, jamé...?

    Visitou um, dois, quatro especialistas e o diagnóstico era o mesmo: “Saúde de touro, dona Rosa (ou seria saúde de vaca?)”.

    Desiludida com os médicos de sua cidade, dona Rosa decidiu consultar-se em Brasília, que considerava a referência da medicina nacional. Depois de visitar oito médicos e ouvir afirmações positivas sobre sua saúde, ela sentenciou:

    - A medicina nesse país tá uma vergonha. Esses médicos novinhos não tão com nada. Como é que não acharam nenhuma doença nesse corpo todo dolorido e alquebrado? Se eu morrer, minha filha, pode processar o plano de saúde.

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    Lido 36 vezes Última modificação em Sábado, 15 Abril 2017 19:59
    Aroldo Pinheiro

    Aroldo Pinheiro,  roraimense, comerciante, jornalista formado pela Universidade Federal de Roraima. Três livros publicados: "30 CONTOS DIVERSOS - Causos de nossa gente" (2003), "A MOSCA - Romance de vida e de morte" (2004) e "20 CONTOS INVERSOS E DOIS DEDOS DE PROSA - Causos de nossa gente".

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