Era uma vez, num reinado imenso, um povo que se dizia feliz, apesar de cobranças de impostos absurdos, juros altíssimos, inflação fugindo ao controle e desmandos de toda sorte.
Num lugar muito, muito distante do centro de decisões, lá no fim do mundo, lá onde, dizem, o diabo perdeu as botas, uma mulher foi designada para dirigir um condado.
Com promessa de governar para o povo, de valorizar mão de obra local, de empenhar-se na educação de crianças e jovens, de oferecer saúde, segurança e dignidade aos discípulos da rainha, a condessa foi recebida por um povo dividido: metade acreditava nas promessas vindas do palácio; metade, escabreada, tinha medo de que a nobre mandatária trouxesse mais sofrimento para a população.
Com o passar dos dias, para azar de todos, o medo da segunda metade foi se confirmando e o número de descontentes aumentando rapidamente.
O ouvidor geral do condado tapeava a condessa dizendo que o dela “era o melhor governo que aquele povo tivera até então”; por outro lado, dados falsos eram levados aos súditos, que, aos poucos, descobria que pílula não era tão dourada quanto queriam mostrar.
Ao final do primeiro ano de governo, o povo foi convidado pruma audiência pública em que a autoridade maior do condado prometia mostrar os feitos conseguidos nos primeiros 365 dias de seu mandado. Para dar impressão de isenção, a nobre mulher convocou pessoa alheia ao palácio para conduzir a prestação de conts, que transcorreu como segue:
Mediadora: Condessa, ao assumir, a senhora disse que governaria com o povo, com pessoas da localidade; essa promessa tem sido cumprida?
Condessa: Sempre valorizei meu povo. E ninguém pode negar que venho cumprindo o que prometi. Veja que meu gabinete é composto por meus filhos, parentes e aderentes. São pessoas do meu convívio, sei da capacidade de cada um e, para cargos de confiança, nada melhor do que pessoas que nos cercam há muito tempo, gente de meu povo.
Mediadora: Senhora condessa, a base de uma administração está em Educação, Saúde, Segurança e Transportes; como está a educação?
Condessa: Não poderia estar melhor. Meus filhos e sobrinhos tiveram educação de primeira. Meus netos e sobrinhos netos frequentam ótimas escolas particulares. Parte de meus netos está sendo mandada para a capital do reinado, onde receberão educação que poucas pessoas desse reinado recebem.
Mediadora: E a Saúde, como vai?
Condessa: A minha vai muito bem. A Saúde de meu povo é um de meus objetivos, tanto que recomendo - e enfatizo – que tenham um bom plano, pois, se dependerem hospitais públicos e postos de saúde, o risco de morte é grande.
Mediadora: E sobre a Segurança?
Condessa: Que horror. Com tanto marginal solto, com uma polícia despreparada e sem viaturas, nós temos que nos proteger. Nossas casas têm cercas eletrificadas, têm sistemas de alarme e são monitoradas por câmeras de vídeo dia e noite. Não podemos abrir mão de seguranças pessoais, pois a criminalidade é endêmica.
Mediadora: E, para encerrar, fale sobre Transportes.
Condessa: Em nossa família, sempre demos prioridade aos transportes. A estabilidade econômico-financeira de um povo se conhece pela idade de sua frota veicular. Entre meu povo, poucos são os carros com mais de um ano de uso. E não queremos saber de carros populares, não. Meu filho, por exemplo, acaba de adquirir um caríssimo modelo alemão: coisa de primeiro mundo.
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