Uma prima, que ela nunca vira, telefonou dizendo estar correndo a Região Norte para conhecer familiares. Candidatou-se a passar um fim de semana em Boa Vista e pediu-lhe para organizar almoço de reconhecimento e confraternização.
Passou o domingo, passou a segunda, a terça, e a prima foi ficando. E incomodando. Só desocupava a rede atada no meio da sala para refeições. Lavar louças não era o forte dela. Varrer, passar um pano? Nem pensar. A presença da parenta mexia com o humor dos ocupantes da pequena residência. Maria Júlia, dona do imóvel e responsável por manter oito dependentes, sentia calafrios quando pensava em chegar à casa e encontrar "aquela coisa" aboletada na rede. Apesar de indiretas, a prima não se tocava.
Reunidos, outros parentes resolveram acudir. Forjaram notícia de que a mãe da prima estava doente e fizeram vaquinha para comprar a passagem de ônibus que levaria a indesejável de volta para Manaus.
Na data marcada. Maria Júlia chegou do trabalho às 18h30, estacionou a moto em posição de saída, pois nem queria ver a cara daquela coisa antes de deixá-la na rodoviária. Quando presumiu que a parenta havia ocupado a garupa da Bizz, engatou marcha e xispou rumo ao terminal de ônibus. Percorreu a avenida Carlos Pereira de Melo, parou na luz vermelha do semáforo do Ibama, onde disse diversos nãos a venezuelanos que queriam vender bugigangas; na avenida Venezuela, subiu e desceu o viaduto e, depois de conseguir cruzar a rotatória do Trevo, chegou à rodoviária.
Parou a moto e viu que a prima não estava na garupa. "Ai, meu Deus". Lembrou-se que, no início do viaduto, uma depressão na pista quase fê-la perder o controle do veículo; concluiu: "A prima deve ter caído da garupa naquele lugar". Voltou prestando muita atenção e nada. Fez, de novo, o percurso até a rodoviária, e nem sinal da parente inconveniente. "Vou voltar pra casa e pedir que o mano me acompanhar até o Pronto Socorro, pois Geiseslany deve estar lá", pensou. Com remorso.
Ao dobrar a esquina de casa, viu Geiseslany, tranquila, mochila nas costas, conversando com a vizinha. Deu-se conta de que a prima nem tinha sentado no selim da Bizz.
Àquela hora, o último ônibus para Manaus já tinha partido. Ana Júlia teve que aturar a prima por mais 24 horas e desembolsar por nova passagem, pois aquela, comprada para a noite anterior, perdera validade.
By accepting you will be accessing a service provided by a third-party external to https://jornalroraimaagora.com.br/