Esqueça o celular por uns instantes. Apague da memória as redes sociais. Agora, tente reviver a Boa Vista da primeira metade dos anos 1940, com apenas três mil habitantes. Esse foi o cenário encontrado pela família do subtenente telegrafista do Exército João Baptista da Silva. A convite do recém nomeado primeiro governador do Território Federal do Rio Branco, capitão Ene Garcez, o paraense chegava para instalar o serviço de rádio e comunicação na nova unidade da Federação.
Toda a estrutura administrativa do então Território Federal, foi acomodada em área cedida pelos padres, no prédio da Prelazia. Ali também ficava o serviço de rádio.
No grupo, estava Astrolino Carneiro da Silva, o Lino, filho mais velho do sub-oficial, na época, com nove anos de idade.
Crescendo no meio válvulas , resistências e transformadores, Lino apaixonou-se pelo rádio e seus segredos. Já adolescente, com voz forte e com boa dicção, ele aproveitou oportunidade surgida e estreou no serviço de som de Celestino da Luz, instalado na rua José Magalhães, onde passaria a funcionar, posteriormente, o Parque Hi-Fi.
"O serviço de alto-falantes levava música de todos os gêneros e informação aos ouvintes. Era o meio de comunicação disponível. Só mudávamos a programação quando alguém morria. Aí passávamos a tocar músicas sacras, em respeito ao ser humano, como se dizia naquele tempo", lembra Lino.
Com a inauguração da primeira emissora de rádio no território (Rádio Difusora Roraima), ocorrida em 1957, na presença do presidente Juscelino Kubistchek, Lino passou a fazer serviços de locução no novo veículo. “Cheguei a fazer o Mensageiro do Ar, um dos programas de maior sucesso na história da emissora”, diz Lino.
Lino também trabalhou em órgãos públicos, como a Sunab e o Detran. Mas, sempre que possível, continuava a exercer o radialismo. Quando perguntado sobre a melhor lembrança da profissão, ele destaca a cobertura da visita do presidente Emílio Garrastazu Médici, no início da década de 1970, a Santa Elena de Uairén, fronteira com o Brasil, onde aquela autoridade reuniu-se com o então presidente da Venezuela, Rafael Caldera. Lino foi na comitiva a convite do jornalista e radialista Laucides Oliveira.
Como fato pitoresco na carreira, ele lembra ter salvado o emprego de grande amigo, motorista civil do 6º BEC. “O cara ia pegar a balsa no Rio Branco, no final da rua Coronel Mota, antigo Porto do Bessa. Errou a manobra e o caminhão entrou no rio. Apavorado, ele me pediu ajuda. Mandei a notícia no ar com elogios à manobra do condutor, que teria salvado inúmeras vidas no local. O comandante aceitou o argumento e ele escapou da demissão”, conta Lino.
Hoje, aos 87 anos, Lino Silva está aposentado. Curte os jogos do Flamengo, embora a fase esteja ruim para o rubro-negro carioca. Volta e meia recorre aos recortes de jornais e fotografias, em volta ao passado. Lamenta estar sem fotos do período. Nem mesmo do programa “Quando os Silva se encontram”, idealizado por Laucides Oliveira e apresentado no Teatro Carlos Gomes. Ele fazia a locução, enquanto sua irmã, a cantora Odilce Silva, e seu sobrinho, o violonista Sérgio Silva, divertiam o público boa-vistense. Bons tempos.