Os olhos do mundo estão voltados para o norte e o nordeste do Brasil e a pauta não poderia ser pior... Os massacres recentes nos presídios de Roraima, Manaus e Rio Grande do Norte assombram o país e o mundo. O palco de barbáries expõe as fragilidades do sistema carcerário estadual e a precariedade das políticas de segurança pública nacional. É inadiável uma discussão profunda e abrangente sobre esta crise, mas a ação emergencial necessária não pode cegar a visão de futuro do Brasil. O combate à criminalidade se faz por meio de estratégias, planejamento e gestão integrados das políticas públicas do país. O descompasso entre os gastos com presos, que é 13 vezes mais do que com estudantes, é inaceitável.
Em novembro de 2016, pesquisa publicada pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública trouxe o panorama da violência no Brasil. Boa Vista foi avaliada como a terceira cidade mais segura do país e primeira da Região Norte com menos mortes violentas.
Como avaliar esse resultado em contraponto ao ocorrido na penitenciária de Boa Vista? O intervalo de tempo é muito curto para sair de uma posição de cidade segura para o que vivemos hoje: total insegurança e medo. Sem entendimento da realidade é impossível achar soluções. Faz-se necessário chegar às causas, e não somente as superficiais, as que saltam aos olhos, como superlotação dos presídios, violação dos direitos humanos, etc. Precisamos ir a fundo para identificar as causas fundamentais que geraram o acontecido, considerando também o que virá a acontecer nos horizontes de curto, médio e longo prazos, a partir dos diferentes cenários do país, estados e municípios. Não temos tempo para discursos.
É tempo de ação, porém em uma perspectiva de gerações, não de mandatos eleitorais. Como disse a Ministra Carmem Lúcia, precisamos de mudanças estruturais e, para tanto, a união de esforços dos poderes executivos nacionais, dos poderes dos estados, dos municípios é condição sine qua non. Precisamos de uma Política efetiva de Segurança Nacional, que considere e gerencie os riscos associados à extensão de nossas fronteiras e que trate o presente na perspectiva do futuro, do que queremos vir a ser.
Boa Vista, capital fronteiriça que concentra cerca de dois terços dos habitantes do estado, vivencia transformações que são resultados de gestão integrada, de objetivos claros comprometidos com horizontes estratégicos que superam quatro anos de mandato.
O combate à criminalidade, a partir do município, pressupõe atuação em diferentes frentes, entre elas: a preventiva no desenvolvimento da primeira infância e o resgate de adolescentes por meio de projetos socioeducativos.
Nossa aposta na primeira infância passa pelo programa Família que Acolhe-FQA, lei municipal implantada em 2013, hoje referência nacional e internacional. Uma política pública integrada que garante que a criança seja acompanhada da gestação até os seis anos. Esse investimento resulta em adultos mais equilibrados, com maior capacidade de se adaptarem a diferentes ambientes e de adquirirem novos conhecimentos. Tão importante quanto investir formação dos pequenos é enfrentar a violência juvenil. Em Boa Vista, a violência entre jovens reduziu-se 72% entre o período de 2001 e 2007, e vem se mantendo. O desenvolvimento de programas socioeducativos é o caminho. O Projeto Crescer, reconhecido pelo Ministério da Justiça como uma das iniciativas mais avançadas no enfrentamento à criminalidade juvenil, é um dos responsáveis por esse resultado.
O FQA e o projeto Crescer têm nos mostrado que o compromisso com o futuro das próximas gerações garante um ambiente que favorece a justiça e qualidade de vida para todos os cidadãos.
Os massacres em presídios estaduais impactaram e sensibilizaram o Brasil por inteiro. Espero que essa indignação fomente, na mesma proporção, o desejo de uma país mais justo, comprometido com o bem-estar comum. Se a generosidade é parte da nossa identidade, vamos fazer com que o compromisso com as futuras gerações também crie raízes na nossa cultura.
*Autora: Teresa Surita, prefeita de Boa Vista