Ele é contundente em suas opiniões. Cantor e compositor, só se apresenta onde aceitem o seu repertório de MPB (Música Popular Brasileira) muito bem calibrado.
João Aroma é assim. Toca e compõe por prazer, sem se incomodar em recusar pedidos da plateia se a música o desagrada. Na verdade, ele se define como “representante da resistência ao mau gosto musical”. Por isso, perdeu contratos. Acusa alguns proprietários de exigir som para dançar e suar. Em breve, abrirá pequeno espaço onde quer receber pessoas com perfil igual ao seu.
Longe de ser grosseiro, apenas segue o lema “a música deve ser boa e de qualidade acima de tudo”.
Aroma nasceu João Carlos Wandenberg. Aos 55 anos, servidor público estadual concursado, formado em Análise de Desenvolvimento de Sistemas, casado, cinco filhos, caminhou o suficiente para defender suas preferências musicais.
Carioca, filho de pai servidor público e mãe roraimense, passou a infância entre o Rio e Boa Vista, onde os pais se conheceram.
O amor pela música aconteceu em Belém, onde morou de 1974 a 1980, quando transferiu-se definitivamente para Roraima.
Década de 1990 - com Neuber Uchoa, Cactu's Pool (arquivo pessoal)
Influências
Na capital paraense, aprendeu a tocar guitarra e, depois, violão. Sua primeira referência foi Jorge Benjor. Mais adiante, seguiu a batida diferente de Djavan. Quando ouviu o LP Galo de Briga, de João Bosco, apaixonou-se pela Bossa Nova, estilo em que vê “uma batida surreal do violão, com melodiosos acordes dissonantes”. Dory Caimmy completou o ciclo de influenciadores.
O nome artístico vem de outro ídolo, Gilberto Gil. Ao iniciar a carreira, em 1980, em Boa Vista, ele adorava cantar a música Aroma. Ao fazer show com Neuber Uchoa, este apresentou-o como Aroma. Na saída do hoje Teatro Carlos Gomes (à época, auditório da Rádio Nacional), as pessoas já o tratavam pelo agora nome artístico.
O primeiro palco foi pequeno bar, localizado no Centro Cívico: era o Degrau’s. Um dos donos, o capixaba Jorge, gostou do seu jeito de tocar. Lá passou vários anos com o repertório de Bossa Nova e MPB, também preferência de Jorge, músico extraordinário.
A carreira
Tido como músico da noite, Aroma descarta o rótulo. “Pelo contrário”, diz ele. “O músico da noite deve ser eclético, transitar por todos os ritmos, pois o público sempre pede algo diferente. Essa turma ganha dinheiro. No meu caso, preciso sentir emoção para passar ao público. Prefiro melodia e acordes caprichados. Se desgosto do repertório, é impossível conseguir isso”, completa.
Compositor vitorioso em festivais, tem parcerias com Sérgio Souto, Neuber Uchoa, Eliakin Rufino, Zeca Preto, Célio Cruz, Valter Rezende, Elias Venâncio, entre outros. Fez shows com o cearense Paulo Façanha, responsável pela divulgação do trabalho no início da carreira de Jorge Vercilo.
Quando o assunto é funk, Aroma garante ser modismo e – torce – vai passar. Para ele, os grandes astros estão no anonimato e a música deixou de ter valor literário. “Fazem música como se faz sapato, para vender. O povo consome música descartável porque é moda. Até em lugares elitizados pedem música para dançar e suar. Cenário difícil de se aceitar”, desabafa.
Com Marcos Valle - Aroma fez o pré show para o consagrado cantor e compositor em Boa Vista (arquivo pessoal)
Os comentários em seu perfil no Facebook muitas vezes provocam reações fortes dos seguidores e críticas de eventuais visitantes. Ele mantém a opinião e segue adiante.
Por isso mesmo, o artista pouco se apresenta em Boa Vista. Só aceita convites de casas onde possa encontrar público identificado com o seu perfil. Se alguém pede músicas de Zezé de Camargo ou Zé Ramalho, ele é sincero: “Desculpe, mas não sei tocar músicas deles”.
Aroma anda cauteloso, porque até mesmo os contratantes insistem no repertório do suadouro. “Hoje, quem entrevista os contratantes sou eu”, comenta aos risos. “Defino o estilo. Se interessar, vamos em frente; caso contrário, nem adianta continuar a conversa. Como eu disse, sou representante da resistência...”
Mais odores de Aroma
O ditado “filho de peixe, peixinho é” ficou pela metade na família Aroma. A caçula, de três anos, Letícia (Leleca), já canta o repertório do pai. O advogado Eduardo toca violão, como o pai. O estudante João é baterista, mas para consumo interno. Mariana, de 14 anos, “canta lindamente”, na avaliação do artista. A primogênita, Larissa, tem gosto musical eclético, sem aventurar-se por instrumentos ou voz. Ele aposta nas meninas mais novas como suas herdeiras. Ficamos na torcida.
A avó de Aroma foi a primeira pessoa da família a chegar em Roraima. Veio trabalhar no garimpo. O pai conheceu a futura esposa aqui mesmo. Ele era funcionário civil no Ministério da Aeronáutica, especialista em rádio navegação. Levou-a para o Rio de Janeiro, onde se casaram e Aroma nasceu.