Truculentos, sem dar chance de o cidadão se explicar, policiais prendem inocente que passa pelos piores 11 dias de sua vida nas mãos do sistema prisonal
10h30 do dia 19 de outubro. Entretido com o nivelamento do contrapiso do cubículo que seria usado como depósito e mostruário das peças artesanais produzidas por sua família, o indígena vê três homens invadirem o terreno de sua morada. Eles lhe perguntam seu nome e, ao ouvir “Leonel José da Silva”, imobilizam o pequeno wapixana, colocam--lhe algemas e comunicam:
— O senhor está preso!
— Calma… preso por quê? Eu não fiz nada. Sou inocente…
— O senhor pode ter esquecido, mas a Justiça não esquece.
— Moço, deixa eu pegar meu documento, deixa eu falar com minha mulher… Eu sou inocente…
Sob olhares de curiosos que se posicionam na rua, Leonel é arrastado até a viatura e, antes de ser jogado no camburão, ouve: — O senhor vai ter muito tempo pra ensaiar o que dizer de sua inocência ao juiz…
Lá de trás, do módulo usado para a produção de artesanato, Ana, esposa de Leonel, corre para ver o que está acontecendo. Não deu tempo. Do portão, só viu a viatura se afastando. Ali começava a saga da família wapixana.
Sem nenhuma ideia do que estava ocorrendo, eles precisavam descobrir para onde o patriarca havia sido levado, por quê e o que fazer para tê-lo de volta. Márcio Alexandre, o filho mais velho, sem nenhuma experiência com polícia, justiça ou advocacia, teve que fazer mágica e correr contra o relógio para libertar o pai. Enquanto isso, entre cadeia, IML, audiência de custódia e penitenciária, ninguém ouvia o clamor de inocência de Leonel.
Ninguém se preocupou em verificar se o homem preso era, de fato, o homem procurado. Uma sequência de erros grosseiros cometidos por autoridades levou um inocente a viver os piores dias de sua vida.
Apesar de não ter nenhuma passagem por delegacias, o indígena da etnia wapixana, Leonel José da Silva, 53 anos, foi preso em sua residência e recolhido à Penitenciária Agrícola de Monte Cristo, onde permaneceu por onze dias — apesar de tentar mostrar, o tempo todo, que sua prisão era um grande erro. Homônimo — A ordem de prisão deveria ter sido cumprida contra outro homem: Leonel José da Silva, conhecido como Zé do Óleo, nascido em 25 de agosto de 1961, filho de José Peter da Silva e Joana Milton da Silva.
Embora todos esses dados de Zé do Óleo estivessem registrados em todas as etapas do processo, agentes policiais coagiram e prenderam o homônimo, Leonel José da Silva, sem checar as dados e nem ouvir os apelos do inocente.
O Habeas Corpus impetrado pelas advogadas Fernanda Félix Cordeiro e Luciane Xavier Cavalcante pôs fim ao erro processual e ao sofrimento do inocente wapixana que, no dia 20, voltou para o seu lar.