By Aroldo Pinheiro on Domingo, 05 Agosto 2018
Category: Crônica do Aroldo

A morte do pistoleiro

Paradoxalmente, a modernidade nos aproxima da antiguidade.

Com as facilidades oferecidas pela internet, usuários de redes sociais de relacionamento estão sempre buscando coisas que os ligue ao passado. Buscam-se amigos dos primeiros anos de escola, buscam-se ex-namorados, buscam-se parentes com quem não se fala há muitos anos. Fotografias, músicas, filmes e livros antigos também ocupam muitos megabites nessa inconsciente volta aos tempos de outrora.

Há poucos dias, um vídeo com Bob Nelson, famoso cantor de músicas do faroeste americano, que fez sucesso lá pelos anos 1950 e 1960, estava sendo divulgado em um dos grupos que frequento. Ouvindo o tiroleite, tiroleite, tiroleite do falso paladino e lembrei-me de Edmilson Lone.

Para sobreviver, ele pintava paredes e abria letreiros no incipiente comércio de Boa Vista. Nas noites de quinta-feira, inspirado em Kit Carson, o correio das planícies, ele vestia calça Coringa, camisa quadriculada cheia de bolsos, fricotes e franjas e, no Programa Jaber Xaud, largava o pau a cantar os tiroleites em clara imitação do estilo Bob Nelson.

Na cidade, ele era conhecido por Baiacu. Não me lembro de seu nome verdadeiro.

Edmilson Lone, o alter ego, aos poucos foi tomando conta da mente de Baiacu. O pintor, de repente, passou a sair fantasiado de caubói para todos os lugares.

Mesmo nos degraus de escadas rudimentares, nosso herói empunhava pincéis e broxas como se fossem Smith & Wessons ou Colts. Baiacu acreditava ter a missão de expulsar os malfeitores da pacata cidade boa-vistense.

Uma noite, nosso xerife entrou na sinuca do Vicentão, levantou a aba do chapéu e, depois de correr a vista por todo o recinto, encarou João-bate-pronto e mandou-o retirar-se do meio dos homens de bem.
Pessoa de pouca conversa, nervoso, João entornou o copo de pinga numa só talagada e, ato contínuo, desceu a porrada em Edmilson Lone.

Dias depois, antes de sair do hospital, Baiacu pediu para a mãe atear fogo nos acessórios e vestes de caubói e dar fim a todos os discos de Bob Nelson.

Naquela data, morreu nosso herói do lavrado. Morreu o nosso pistoleiro