Entre o final do século passado e o início deste, medidas tomadas pelo Governo Federal modificaram a geografia de Roraima, mexeram com sua economia e causaram - e vêm causando - prejuízos a quem um dia sonhou participar do desenvolvimento do extremo norte do Brasil via agronegócios. Com a homolagação da terra indígena Raposa-Serra do Sol, agricultores e criadores foram obrigados a sair de suas propriedades com promessa de indenização e realocação em áreas semelhantes. Cerca de 300 famílias deixaram terras, investimentos e história para trás; muitos não receberam nenhum centavo sequer como compensação ou foram alocados para retomar suas vidas.
O pior é que, com processos julgados pelo Supremo Entre o final do século passado e o início deste, medidas tomadas pelo Governo Federal modificaram a geografia de Roraima, mexeram com sua economia e causaram - e vêm causando - prejuízos a quem um dia sonhou participar do desenvolvimento do extremo norte do Brasil via
agronegócios.
Com a homolagação da terra indígena Raposa-Serra do Sol, agricultores e Tribunal Federal, última instância da Justiça brasileira, os prejudicados ficaram sem ter a quem recorrer.
A novela não terminou Calma. Os prejudicados ficaram sem ter a quem recorrer dentro da Justiça brasileira, mas Wilson Précoma, advogado, que defendeu interesses da Fundação Nacional do Índio (Funai) entre 1993 e 2016, diz ter assistido ao enredo dessa história e, por meio de cuidadosa análise de documentos e de passos tomados pelo governo brasileiro, concluiu que a condução dos processos foi feita de maneira atropelada e que, sob a guarda de acordo internacional, as arbitrariedades podem ser revistas e os prejudicados - não índios e índios - têm a possibilidade de serem indenizados condignamente, dentro da legalidade.
Se todos os cerca de 300 desalojados de terras indígenas entrarem com ação judicial na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, órgão afeto à Corte Inetramericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos) a União pode ser obrigada a desemsembolsar alguns milhões de dólares e as vítimas terão como, de fato, dar rumo às suas vidas.
União terá que desembolsar alguns milhões de dólares
Wilson Précoma diz que órgãos internacionais, com sede na Alemanha, criaram fundos e transferiram valores para que o governo brasileiro indenizasse os ocupantes das terras que seriam transferidas para índios. Essa verba foi usada em outras finalidades; assim, não sobrou caixa para compensar os “desintrusados” condignamente.
Précoma af rma, ainda, que a avaliação de benfeitorias foi feita de maneira inadequada, levando os poucos que receberam algum dinheiro a receberem valores irrizórios, bem aquém do que lhes garante o direito.
O advogado enfatiza que o Brasil é signatário da Convenção Americana de Direitos Humanos de San José da Costa Rica, de 22 de novembro de 1969, e que o direito à propriedade é o foco maior desse acordo. “Assim, em pouco tempo - no máximo em dez anos - a ação terá sido julgada e teremos ganho de causa”, acredita.
“Decidi chamar pra mim essa ação ao ver a situação de penúria que boa parte de proprietários e detentores de posse da área indígena vive atualmente”, justifica. Ele diz não poder fi car omisso diante das injustiças praticadas, principalmente, pelo fato de o STF ter decidido a questão por critérios eminentemente políticos, sob o signo de fazer justiça histórica judiciando uns em detrimento de outros, pois, segundo afirma, “não se pode fazer justiça para alguns injustiçando os outros, com
dois pesos e duas medidas”, complementa.
Dos quase 300 prejudicados pela ação do governo federal, o rizicultor Napoleão Antônio Zeola Machado é o único que contratou os serviços de Wilson Précoma. O
causídico diz que, independentemente de constituírem advogados, as pessoas relacionadas na demanda ora iniciada terão direito a receber indenização.
Uma mão na frente; outra atrás (Foto: Arquivo pessoal)
Napoleão Zeola Machado produzia arroz nos milhares de hectares adquiridos legalmente, usando de boa fé, na confortável fazenda Mangueira, à margem do
rio Jauari, norte do Estado.
Com a demarcação, desapropriação e homolagação das terras indígenas Raposa- Serra do Sol, o rizicultor foi obrigado a sair de sua propriedade e, até hoje, nem recebeu nada como indenização; ao ocupar a área que lhe destinaram, descobriu que já tinha dono e, hoje, ele move ação contra o Incra.
Falido, Zeola mora modestamente em Rorainópolis e sobrevive de serviços de contabilidade que presta a comerciantes do lugar. “Acredito na possibilidade de uma revisão nessa agressão que nos fizeram”, diz.